"Só os mortos conhecem o fim da guerra"
Platão

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O senhor da guerra não gosta de crianças



Achei esse vídeo enquanto navegava no Youtube esses dias, e pensei logo em postar aqui, por causa do tema e tal. O vídeo é na verdade uma compilação de imagens atuais de situações de guerra, principalmente do Oriente Médio, ao som de uma música do Legião Urbana. O nome da música é A Canção do Senhor da Guerra, e quem viu o vídeo certamente reparou na letra da música. Tendo em vista isso, resolvi fazer uma pequena reflexão quanto à letra, que pode ser encontrada aqui.

A letra como um todo fala sobre as guerras mais modernas e financiadas por grandes países, que ocorrem fora do território dos seus financiadores e, portanto, não gera destruição em seus territórios. Um bom exemplo disso é a Guerra do Vietnã: Destruiu todo o território vietnamita, enquanto que os Estados Unidos tiveram mais um impacto moral do que financeiro (mas foram eles quem perderam a guerra!). A música trás vários pontos importantes, além de sua mensagem central. Os principais:

  • Na primeira estrofe, Renato Russo canta "Existe alguém esperando por você / Que vai comprar a sua juventude / E convencê-lo a vencer". Esta frase, como introdução, é importantíssa: Ela mostra o interesse que o governo tem nos soldados, financiando todo o seu treinamento e sua estadia em guerra, destruindo, porém, sua juventude - este sujeito poderia se tornar um profissional de peso, contribuindo com o avanço do país por meios totalmente pacíficos. Este dinheiro poderia ser usado para financiar os estudos deste sujeito, e não o seu treinamento bélico, potencializando ainda mais a sua capacidade de se tornar alguém que realmente possa contribuir com o seu país.

  • Logo depois temos um outro trecho importante: "Mas explicam novamente que a guerra gera empregos / Aumenta a produção". Esta é uma típica desculpa de guerra. Na verdade ela não deixa de ser uma realidade, realmente uma guerra gera mais empregos e aumenta a produção (principalmente a bélica e a alimentícia, uma vez que os alimentos devem ser todos industrializados) dos países financiadores. Além disso, a guerra gera medo, e isso é um fator político muito importante: um governante pode se manter no poder pelo medo que a população tem da guerra fracassar, caso ele saísse.

  • “Uma guerra sempre avança a tecnologia”. Importante notar que aqui há uma verdade imensa. Grande parte das tecnologias que utilizamos hoje é proveniente de guerras. Vale lembrar que o se humano guerreia desde que começou a viver em comunidade. A guerra, portanto, disponibilizou que o homem desenvolvesse uma série de tecnologias para sobreviver, e muitas delas foram sendo aprimoradas por outros caminhos que não o bélico. Como exemplo o aço, a tecnologia naval, a pólvora, arquitetura (pontes, estradas, fortes), etc. Importante saber que a tecnologia proveniente de uma guerra não é sempre bélica: é necessário desenvolver sistemas de defesa, de enfermagem, tecnologia pros acampamentos e bases, locomoção, tecnologia naval e aérea, etc. Este é, realmente, um lado positivo da guerra.

  • “Pra que exportar comida? / Se as armas dão mais lucros na exportação”. Esse questionamento de Renato Russo é digno de reflexão: ele trás a tona os direitos humanos quando fala da escolha das armas por causa do dinheiro. Um país deveria se desenvolver belicamente apenas para poder se defender quando necessário, e não para gerar lucros. A indústria alimentícia é um meio muito mais nobre de se gerar lucro com exportações, uma vez que está se ajudando a erradicar um mal muito grave no mundo (a fome) ao invés de patrocinar um conflito armado. Esse conflito, inclusive, poderia ser gerado pela própria busca de comida, como ocorre em alguns países na África.

  • Mais para o final da música, Renato Russo canta: “Existe alguém que está contando com você / Pra lutar em seu lugar já que nessa guerra / Não é ele quem vai morrer”, o que demonstra uma questão filosófica muito presente em uma guerra, que é o fato dos grandes culpados e financiadores da mesma não pegarem nas armas, ficando sempre protegido atrás dos soldados, apenas planejando. Como pode um sujeito comandar exércitos sem nunca ter estado em uma situação de guerra? Qual a confiança que ele gera para seus soldados? Porque um soldado se sacrificaria por alguém que nunca se sacrificou por ninguém?

  • Nos versos “Não teremos mais problemas / Com a superpopulação / Veja que uniforme lindo fizemos pra você”, percebemos uma grande ironia que reflete muito bem o pensamento cínico dos chefes de estados que não estão nem ai com os seus soldados, não se importando se eles venham a morrer, pois isso reduziria a população. Os uniformes seriam mais um cinismo por parte deles, como se fossem fabricados por alguém que se importa com a saúde dos soldados.

  • No final temos o refrão, “O senhor da guerra / Não gosta de crianças”. A primeira vista esse refrão parece ter um significado abstrato, criado pelo autor apenas para trazer musicalidade ao final da música, mas ela tem um significado concreto sim. Um senhor da guerra é um sujeito com poder militar de facto sobre uma determinada região, devido ao fato do exército daquela região obedecer às ordens dele do que da autoridade oficial do local. Senhores da guerra são freqüentes em países africanos onde ocorrem grandes guerras civis, como Somália ou Congo. Lá, esses senhores da guerra armam toda a população, inclusive as crianças, para lutar na guerra, e as crianças, por serem fracas e ingênuas pela própria idade, acabam falecendo com maior facilidade. Por isso o refrão. O que ocorre nesses países é um verdadeiro abuso dos direitos humanos, que são, além de desrespeitados, ignorados. Realmente, os senhores da guerra não gostam das crianças!

Por João Vicente Padão Rovani

3 comentários:

  1. Muito legal o grupo ter trazido esta música para ser analisada. Tem tudo a ver com o tema trabalhado pelo grupo e a análise feito dos trechos da letra, facilita a compreensão da mensagem da música, mesmo que esta já esteja clara. É muito ruim vermos que os governos usam as pessoas para fazerem guerras apenas para gerar dinheiro e passar sobre os princípios de ética e solidariedade. Gostaríamos só que tivesse um poquinho mais de relacionamento com a sustentabilidade, para que pudéssemos entender a relação do tema com o meio-ambiente.

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  2. Parabens pela música linkada. Diante de tanta letra alienante com que nos castiga o funk reinante, isso parece um ilha de inteligência.
    Fazendo um paralelismo também poderiamos dizer que os políticos brasileriros que abençoam a compra de 36 jatos de guerra a um custo de 88 milhões de dólares cada, não gostam das crianças brasileiras!!!!!

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  3. Quero agradecer muito muito por essa análise, me ajudou demais no trabalho de escola, de história, muito obrigada!

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